A primeira vez que Adelaide cozinhou foi uma feijoada em Cabo Verde, de onde é natural. “Tinha 10 anos ou 11 anos”, hesita. “A minha mãe tinha ido trabalhar e eu fiquei em casa com os meus irmãos, depois da escola fui para a cozinha fazer uma feijoada”, recorda à New in Amadora. O sabor ficou bom, mas a feijoada ficou verde. “Cozi a couve e pus bicabornato. Na altura, era miúda, não sabia que tinha de deixar a couve debaixo de água até sair o bicabornato. Portanto, a feijoada estava saborosa mas parecia o Shrek”, diz a rir-se.
Adelaide nunca mais usou bicabornato e, aos 50 anos, é proprietária do restaurante Tia Madá, situado no Casal de São Brás, Amadora, onde faz aquilo que mais gosta: cozinhar e dar largas à sua imaginação. O espaço, que está aberto de terça-feira a domingo, das 9 às 23 horas, tem a cozinha sempre pronta para qualquer petisco, e divide-se entre a riqueza da gastronomia portuguesa e a magia dos sabores africanos
“Este restaurante é uma homenagem à minha irmã, que se chamava Madalena, e a alcunha era Madá, e então coloquei este nome em homenagem a ela. É um sonho que nós tínhamos as duas. Infelizmente, ela partiu cedo demais, e não pôde concretizar esse sonho, e eu não desisti enquanto não abri o restaurante”, conta a empreendedora, que abriu as portas do espaço no ano passado.

Ao seu lado, Adelaide tem o companheiro, Alberto, com quem está há “25 ou 26 anos” — “a matemática não é o nosso forte”, diz-se a rir — e Rui, o “sobrinho-filho”, como trata carinhosamente o primogénito da irmã. Os três vestem a camisola do Tia Madá. “Eu estou na cozinha, o Alberto está na grelha e o Rui no atendimento”, explica.
A mãe é cozinheira, e Madalena, cinco anos mais velha do que a irmã, também era. “Ela tinha 50 anos quando morreu, em 2020. Partilhamos paixão pela cozinha e abrir um restaurante era um sonho que tínhamos em comum. Infelizmente, a vida pregou-lhe uma rasteira, mas ter aberto este espaço é uma forma de eu sentir que a Madá está comigo”, conta, emocionada.
Adelaide é “mais uma natural de Cabo Verde que veio para a Amadora”, diz com um sorriso. Está em Portugal desde 1977. Veio “pequenina” com os pais. “Primeiro, fomos para as Portas de Benfica, depois viemos para o Casal de São Brás e nunca mais saí daqui”.
Originária da ilha de Santiago, confessa que nunca mais voltou ao seu país natal. “Tenho saudades, mas não são assim tantas. Vim com os meus pais, os meus avós partiram cedo, portanto, não tenho ninguém que me chame, não há um motivo especial para voltar”, conta, embora admita que tenha “curiosidade em voltar para ver como estão as coisas”.
Com os antecedentes culinários na família, Adelaide sempre percebeu que era este o seu sonho. E por isso não se poupou à formação. “O primeiro restaurante onde trabalhei foi um chinês. Para mim, era tudo novo e estranho. Tive de aprender do zero a fazer chop suey, arroz xau-xau, e por aí fora. E gosto muito de comida chinesa. Aliás, cheguei a fazer alguns cursos e workshops para melhorar as minhas técnicas, não só de cozinha chinesa, como de gastronomia regional portuguesa”.
“Sempre vi a minha mãe e a minha irmã como meus ídolos. Queria muito ser como elas. Admirava muito o que elas faziam e queria acompanhar a evolução delas e, ao mesmo tempo, crescer profissionalmente”, confessa à New in Amadora.
A mãe, com os seus 74 anos, “continua a cozinhar todos os dias” em casa. “O meu pai morreu há muito tempo, eu tinha cinco anos, mas a minha mãe está muito bem, graças a Deus. A cozinha continua a ser uma terapia para ela. Só não faz doces, mas faz salgados e panelões de comida”, conta divertida.
Africanos gostam da cozinha portuguesa
A empresária, que gosta mais de cozinhar do que comer — “prefiro uma salada ou fruta, talvez porque passe o dia a cozinhar” — está satisfeita com a forma como tem corrida o negócio. “Está a correr bem. Nem todos os dias são ótimos, mas compensa. Os clientes saem daqui satisfeitos, que é o mais importante, e voltam. Elogiam bastante a casa, a comida e o atendimento e, por isso, não há razão de queixa”, explica, acrescentando que “neste momento, a divisão de clientes portugueses e africanos é de 50-50”.
“O que é engraçado é que temos cada vez mais portugueses que vêm cá à procura de pratos africanos, enquanto os africanos pedem pratos portugueses”, garante.
O Tia Madá tem uma ementa fixa, em que tudo é feito ao momento, e ainda um menu do dia, que normalmente é composto por dois ou três pratos. O menu, que inclui prato, bebida, sobremesa (ou sopa) e o café, custa 11,50€.
Os pratos africanos ficam reservados para o fim de semana: sexta, sábado e domingo. “Temos a Cachupa rica ao sábado, embora por causa da procura também façamos à quarta, temos a Muamba (sexta e sábado), temos o Tchep Djen, que é do Senegal, o Caldo Mancarra, da Guiné-Bissau, entre outros”.
Da lista fixa há muito peixe grelhado, que Alberto trabalha com mestria: dourada, robalo, salmão (todos a 12€), chocos e bacalhau à lagareiro (13€), e nas carnes, destacam-se a grelhada mista (9€), a picanha (12€) e a costeleta de novilho (13,5€).
O polvo à Lagareiro, o Arroz de Tamboril (ambos a 18€) e o bife da casa (13,5€) são as especialidades da casa.
Trabalhar todos os dias ao lado do marido é “fácil”, diz Adelaide, embora dê uma risada para Alberto. “Já nos conhecemos há muito tempo. Trabalhámos juntos no mesmo restaurante durante alguns anos e nasceu uma amizade muito linda”, diz.
Não, não foi amor à primeira vista. “Ele teve de se esforçar bastante, que isto não é logo à primeira”, conclui, enquanto olha para o companheiro com ar provocador.
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