A rua é estreita, sombria e sem grande movimento. Mas é lá que encontramos a Estrela de África. Não foi por acaso. Foram vários, nos dias anteriores, os cabo-verdianos e angolanos que tinham indicado à New in Amadora esta casa na Damaia. “É a melhor cachupa da Amadora”, garantiram-nos. Não temos como provar, mas da fama, o restaurante já não se livra.
“O negócio tem corrido bem, graças a Deus, embora gostássemos sempre de ter mais clientes. Mas acho que isso todos gostávamos. Há fases melhores, há fases piores, acho que quem trabalha na restauração já está habituado a isso”, conta Aldina Carvalho, 47 anos, que abriu o estabelecimento há cinco anos, com o marido, Moisés.
A clientela é maioritariamente africana, embora “de vez em quando lá apareçam pessoas que não vêm de África”, diz Aldina, ela própria cabo-verdiana. Mas de todos os clientes que podiam aparecer, há um que a empresária e cozinheira jamais estaria à espera: Marcelo Rebelo de Sousa, ele próprio, em pessoa. O Presidente da República foi ao Estrela de África, acompanhado do presidente da Câmara da Amadora, Vítor Ferreira, no dia 1 de novembro e cumpriu uma velha tradição cabo-verdiana.

“O presidente comeu milho-verde e bebeu grogue, uma espécie de aguardente típica da nossa terra com uma elevada percentagem de álcool”, conta Aldina a rir, quando lhe lembramos o episódio. E comeu a célebre cachupa? “Não, era de tarde, já tinha almoçado”, lamenta. “Mas prometeu voltar para uma cachopada”, revela à NiA.
A cachupa (11€ no menu) é que reina, já se percebeu. “É o prato que toda a gente quer, é muito gostosa”. Quando lhe fazemos a pergunta para um milhão de dólares, Aldina abre muitos os olhos, esboça um sorriso aberto e diz com um ar jovial: “Ah, isso não lhe posso dizer. Segredo é segredo. Se lhe contasse, deixava de ser segredo”, diz e solta uma gargalhada.
Uma coisa, porém, a gerente revela. “Quem está na cozinha sou eu. Sou eu que faço a cachupa”, diz. E, aos poucos, lá vai levantando o véu, que é como quem diz, destapando o tacho. “A cachupa, na verdade, é quase toda igual em todo o lado. A grande diferença da minha cachupa em relação às outras que se comem por aí é que a minha tem muito amor. E tudo o que se faz com amor sai melhor, sai mais gostoso, mais apurado”.
Cozinha sempre aberta
A conversa está gostosa, mas Aldina olha para o relógio. Acabou de limpar a sala. Da cozinha vem aquele aroma característico, enquanto ultima as mesas para os almoços. Na Estrela de África é assim todos os dias. Só à quarta-feira é que Aldina e o marido, Moisés, encerram a casa para libertarem a cabeça. “De resto, estamos sempre abertos, sábados e domingos incluídos”, assegura. De sol a sol, já que servem almoços e jantares. “Nunca fecho a cozinha, porque a malta vai ficando, vai comendo, come tarde. Sabe como é a malta africana não tem horários para comer”, revela.
A casa, muito conhecida por aquelas bandas — está implantada há cinco anos — abre ao meio-dia e só fecha às portas às 23 horas. “Mas às vezes, eles vão ficando por aqui”, ri-se. Eles, os clientes, entenda-se. Ainda assim, Aldina gostaria de estar numa rua mais movimentada da Damaia. “Estamos aqui escondidos e vivemos muito do passa-palavra. Quem nos conhece, gosta, volta e recomenda”.
Para quem não gosta de cachupa, ou quer variar, Aldina tem sempre carne e peixe para grelhar. “A dourada (dose a 13€) sai sempre bem, a picanha (15€ por dose) e os bitoques de vaca (12€) também, mas nós somos mesmo conhecidos pela cachupa guisada com os ovos estrelados e isso. À boa maneira cabo-verdiana, a cachupa não se faz todos os dias, “porque ao terceiro e quarto dia é que ela está mais apurada, muito melhor”.
Aldina já se sente mais portuguesa do que cabo-verdiana. Aliás, estando em Portugal há 26 anos, já viveu tempo cá do que no país da morna. “Vim com familiares”, recorda à NiA, sem se alongar muito.
Volta a Santiago, a maior ilha do arquipélago, de onde é natural, “de vez em quando”, mas sente que já não é de lá. “Agora, a minha é cá. Tenho cá as minhas coisas, a minha família e os meus filhos”. O mais velho já tem 22 anos e o mais novo vai fazer 14.
A família, percebe-se, é tudo para Aldina. Os olhos brilham quando fala dos filhos, que também gostam de cachupa, e do marido, que também não prescinde do prato-estrela do restaurante. “Acredite, não há cabo-verdiano que não goste de cachupa, é o nosso prato, está-nos sangue”, diz.
A paixão pela cozinha não aconteceu de um dia para o outro. “Sempre gostei de cozinhar. Aprendi com a minha mãe. Infelizmente, já faleceu, mas recordo-me que ela tinha uma boa mão e a comida era muito saborosa”. Também tinha amor, a comida da mãe? “Claro que sim. De onde pensa que vem o meu?”, responde com nova gargalhada.
Carregue na galeria e veja alguns dos pratos que pode comer no Estrela de África.