Há 17 anos, Alda Simões estava a chegar aos 45. Tinha uma vida estável, sem larguezas, mas sem sobressaltos. Porém, quando o banco de investimento norte-americano Lehman Brothers faliu em 2008, desencadeou uma crise financeira na Europa, que chegou a Portugal pouco tempo depois. Alda foi uma das vítimas.
“Fiquei desempregada, perdi a casa para o banco, enfim, a minha vida deu uma volta grande. Sou quase uma Fénix renascida”, conta à New in Amadora.
Na altura, tentou encontrar emprego de novo, mas todas as portas estavam fechadas. Decidiu então criar o próprio negócio e abriu, em 2013, a Pour Toi, uma loja de roupa em segunda mão no Casal de São Brás, na freguesia da Mina, na Amadora.
“Primeiro, abri numa loja mais pequenina, só mais tarde é que, dado o sucesso das vendas, passei para esta loja onde estou agora”. Alda acrescenta que voltou a trabalhar como administrativa em part-time. “Só com a loja não me aguento, apesar de estar a correr bem, mas eu adoro o trabalho de escritório e, portanto, vou continuar nesta vida dupla”.
Alda garante que sempre se preocupou com a sustentabilidade. “Ainda muito antes disso ser um tema na berra. Ainda não se falava muito de economia circular e eu já a praticava aqui na minha loja. Sempre gostei de peças em segunda mão, e sempre procurei acabar com esse preconceito. Até acho algo poética essa ideia de que as roupas têm uma segunda vida, uma segunda oportunidade de fazer alguém feliz, quando, por razões várias, já nos servem a nós”.
E recorda o tempo em que dizia às amigas que “as lojas de roupa usada seriam as lojas do futuro”. “Acho que hoje isso se veio a confirmar. Há cada vez mais negócios nesta área. O preconceito em relação às coisas em segunda mão não passou totalmente, no entanto, tem vindo a mudar e, modéstia à parte, sinto que contribuí muito para isso, porque aqui no Casal de São Brás havia muito esse preconceito”, afirma à NiA.
O fim do mito
No início, quando abriu a loja, “as pessoas compravam a medo, gostavam das peças, mas escondiam o saco na mala com uma certa vergonha”.
“Hoje verifico que isso já não acontece, até porque há muita informação nas redes sociais, os tempos são outros, as pessoas foram-se adaptando às novas realidades”.
Alda não tem dúvidas de que as plataformas como a Vinted “ajudaram a quebrar esse preconceito”. “Hoje as pessoas percebem que se a roupa já não lhes serve, ou já não gostam dela, é um crime deitar fora, quando há tanta gente carenciada. E além disso podem ganhar dinheiro com isso”.
Na Pour Toi é possível comprar roupa e acessórios em segunda mão, mas também vender, apesar de a proprietária esclarecer que só trabalha à consignação. “Ou seja, as pessoas deixam a peça que querem vender e depois quando vendo, dou metade do valor da venda”.
Os tempos mudaram e Alda sente que “há cada vez mais gente a recorrer a roupa usada. “Eu própria, enquanto cidadã, tive de me ir adaptando às novas realidades da minha vida. Tenho noção que as crises são cíclicas. Quando acaba uma, vem outra a seguir. Tive de me ir adaptando. Quando abri a loja, só praticava preços na ordem dos 10€ e hoje tenho peças muito boas até a partir de 1€”, exemplifica.
Uma coisa é certa: todas as peças vendidas na loja do Casal de S. Brás “estão em bom estado”, garante a fundadora.
Crise aumentou dificuldades
Se hoje já não sente tanta vergonha nos seus clientes, isso acontece porque se constituiu ali uma família. “Moramos todos aqui, as pessoas gostam de mim, eu gosto das pessoas, muita gente conhece a minha história, e, portanto, não há que ter vergonha”, sublinha Alda à New In Amadora, acrescentando, no entanto, que atualmente há mais residentes do bairro que não iam à loja comprar roupa “e que agora vão”.
A empresária vê nisso um sinal do aumento das dificuldades das pessoas para esticar o orçamento mensal. E é por isso que não tem dúvidas em afirmar que a Pour Toi é um bom negócio. “O meu problema é que estou no sítio errado, numa rua que não tem tanto movimento. Bastava esta uma rua abaixo, ao pé do talho, das pastelarias, da papelaria, e era logo diferente, mas como estou na rua de cima, há menos gente a passar e a loja é menos visível”.
Mudar, para já, está de fora de hipótese. “Eu tenho é os pés bem assentes no chão, porque já perdi tudo na vida com a crise e agora tenho mais medo de arriscar, é compreensível. Mas se me sair um Euromilhões ou um Eurodreams, quem sabe”.
Carregue na galeria para conhecer algumas das peças que pode comprar na loja da Amadora.