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Ana Sofia foi vítima e agressora. Agora combate o bullying ao lado de Luís Fernandes

Criado em 2022, o projeto Bullying.pt quer ter uma palavra a dizer no combate aos vários tipos de violência e ao cyberbullying.
Fotografia: Luis Moreira

A modelo e atriz Ana Sofia tinha menos de 10 anos quando foi vítima de bullying na escola. “Passava por algumas agressões físicas, sofria pressão psicológica e sentia muito medo. Era aterrorizada com coisas que podiam acontecer”, confessa. Mais tarde, entre os 10 e os 13 anos, acabou por tornar-se agressora.

“Agora, ao olhar para trás e já com muitas sessões de terapia, consigo perceber que as minhas circunstâncias familiares não eram as melhores. Isso causava-me algum transtorno e inveja em relação às minhas colegas, que tinham uma vida mais convencional. Mas não saber verbalizar o que sentia levava-me a aterrorizar algumas colegas na escola, de forma verbal e física”, confessa.

Quando surgiram as primeiras queixas contra si, na escola, Ana Sofia começou a perceber que os seus comportamentos não eram corretos. “Tinha consciência disso, mas não tinha ferramentas para os parar, nem para entender muito bem aquilo que acontecia.”

A entrada de uma nova psicóloga para a escola fez toda a diferença no seu comportamento. “Aos 13 anos, fui confrontada pela primeira vez com o meu mundo interior, as minhas lutas e dores. Os jovens, por vezes, são demasiado auto centrados, outros que não são nada, e eu estava nesse grupo, completamente perdida. O trabalho da psicóloga ajudou-me a encontrar a minha voz e a conseguir exprimir o que sentia de outra forma, sem ser pela violência.”

O encontro com Luís Fernandes

A primeira vez que Ana Sofia abordou o assunto publicamente foi quando recebeu um convite da Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) de Amora/Seixal para participar num evento onde conheceu o psicólogo Luís Fernandes, que criou em 2022 o projeto Bullying.pt.

“A partir daí começámos a criar a dinâmica de sessões, de ir às escolas com o projeto e faz-me todo o sentido falar desta temática do ponto de vista de quem já passou pelo mesmo, e já fez outras pessoas passarem por isso”, confessa.

“Ir às escolas é a parte mais compensadora, pois estamos no campo, onde as coisas estão a acontecer. Os miúdos reagem à nossa presença, fazem muitas perguntas, participam ativamente durante a sessão, é um espaço seguro onde mostramos aos miúdos que não estão sozinhos.”

Devido à influência que a psicóloga teve na sua vida, Ana Sofia reconhece a importância do trabalho desenvolvido por Luís Fernandes. “Admiro-o porque percebo o tipo de poder e a influência que pode ter junto destes jovens.”

O que é o Bullying.pt

Psicólogo numa escola na Vidigueira, Luís Fernandes, de 50 anos, conta que a ideia de criar uma plataforma dedicada a estes casos “foi amadurecendo ao longo dos anos. Até porque houve outros projetos em que estive envolvido, mas a ideia era criar uma filosofia de abordagem dos comportamentos de bullying e cyberbullying em idade escolar, mais interativa e próxima das pessoas”.

O foco passa por dar formação e informação a todos os públicos, “desde crianças e jovens, até aos pais, professores, aos técnicos, já que não havia facilidade de acesso à informação”, revela. O projeto nasceu em outubro de 2022 “porque é o mês da prevenção e combate ao bullying a nível mundial”.

Natural da Margem Sul, Luís confessa que sempre frequentou escolas “um pouco agitadas, no pós-25 de Abril, o que me fez apanhar aquele caldeirão cultural dessa altura. Sempre me interessei pelos temas da indisciplina, a violência na escola, o bullying e, mais recentemente, o cyberbullying”.

Ainda assim, nunca passou por situações de violência na escola. “Costumo dizer que o meu perfil seria mais de agressor. Havia brincadeiras, alcunhas que se colocavam ou deixar alguém de parte e não tínhamos muito bem a noção do que estávamos a fazer. O meu ativismo começou nessa altura, por volta dos 14 anos, quando tomei consciência desta realidade.”

Tipos de bullying

Segundo Luís Fernandes, cada vez existem mais situações de violência online porque “é veículo onde os miúdos estão e numa idade cada vez mais precoce”. Existem vários tipos de violência, desde verbal à física, psicológica, relacional ou sexual “e todas podem ser exercidas através dos dispositivos digitais, exceto a física. O problema é que o cyberbullying envolve uma gravidade e uma visibilidade nunca vista. O impacto é muito significativo”, diz.

“Uma vítima de bullying tem quatro vezes mais possibilidade de cometer suicídio, mas quem é vítima de cyberbullying tem 10 vezes mais possibilidade de acabar com a vida”, denuncia o psicólogo.

O aumento está relacionado com a visibilidade a que a vítima é exposta. “Uma coisa é ser agredida na escola, onde poucas pessoas sabem, outra é expor um conteúdo online, que ganha uma dimensão tal que, mesmo pessoas que não conhecem a vítima, podem ter conhecimento do assunto.”

Novos embaixadores

Apesar do impacto da presença de Ana Sofia ser importante para a divulgação do projeto, a ideia passa por encontrar novos embaixadores, “porque as referências também vão passando”, assume a atriz. “Tenho 37 anos e estou a falar para miúdos do ensino preparatório e secundário. O que estamos a tentar fazer é arranjar mais figuras públicas, mais jovens, com quem este público se identifique de uma forma mais direta para desmistificar esta temática.”

Às vítimas de bullying, o conselho passa sempre por fazer a denúncia a um adulto. “À família, a um professor ou até um funcionário da escola, o importante é denunciar”, aconselha Luís Fernandes. “Isto porque 60 por cento das vítimas não denuncia e, quando o faz, demora cerca de 13 meses a fazê-lo.”

 
 
 
 
 
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