Quando aos “nove, dez anos”, Rita Rego chegou a casa, vinda da escola, e contou aos pais que tinha vendido a uma amiga a sua primeira pulseira de missangas, estes perceberam que tinham feito a coisa certa.
“Os meus pais sempre me incentivaram a comprar as minhas coisas por mim, sem ajudas externas e sem depender de ninguém. Uma coisa era a nossa comida, a nossa roupa, a nossa saúde, a nossa educação. Isso, eles providenciavam. Tudo o resto, tínhamos de batalhar para conquistar”, recorda à New in Amadora.
A artesã, de 25 anos, é a mais jovem expositora da Feira dos Saberes e Sabores, que esta quinta-feira, 24 de abril, arranca no Parque Luís de Camões, na Brandoa, freguesia da Encosta do Sol, Amadora.
“Dou graças a Deus por ter tido os pais que tenho”, elogia, acrescentando que se hoje é a mulher “batalhadora, resiliente e que nunca vira a cara à luta” o deve a eles. “Comecei a fazer as missangas, para ganhar uns troquinhos, apesar de fazer mesmo por gosto. Fazia com as minhas amigas e trocávamos na escola. Os meus pais tinham um café na Brandoa, e as velhotas achavam-me muita graça, gostavam das pulseiras e acabavam por comprar”.
A pequena Rita não tinha mãos a medir. Num mês chegava a fazer 40€. “Achava que estava rica. Era muito dinheiro para a minha realidade e eu adorava”, ri-se.
Juntava tudo num mealheiro e, depois, quando lhe apetecia, comprava as coisas que queria. “Na altura, havia a febre da revista Bravo e aquilo custava 2€, e eu em vez de pedir à minha mãe, já tinha o meu dinheiro para investir”, acrescenta, cheia de orgulho.
Das missangas saltou para os doces. “Sou escuteira desde pequenina e sempre fomos motivados a ir aos acampamentos e tínhamos de angariar o nosso dinheiro. Numa atividade de grupo, que era um evento gastronómico diferente, a minha patrulha preparou brigadeiros de coco e chocolate e eu aprendi a fazer”.
Era o primeiro ano de Rita na secção de Exploradores, depois de já ter sido Lobita. Tinha 12 anos. “Quando regressei a casa, voltei a fazer os bolinhos e distribuí pelos clientes no café dos meus pais e toda a gente gostou”.
Sai um café e um brigadeiro
A cabeça de Rita pensou logo no que poderia ganhar com a nova aprendizagem. Passou a fazer regularmente e ficavam na montra, ao lado dos restantes bolos, no café dos pais. “Acabei por fazer um acordo com a minha mãe. Ela vendia um café e um brigadeiro por 1€, e 45 cêntimos eram para mim. Também foi um sucesso e fiz dinheiro”, conta a rir.
O seu lado empreendedor não ficou por aqui. “Nunca fiz isto por necessidade, porque felizmente nunca nos faltou nada em casa, nem a mim nem aos meus irmãos”, conta a mais velha de três. “Os nossos pais sempre nos deram as bases para chegarmos onde queremos, ganhando o nosso dinheiro de forma honesta”.
Foi assim que em 2014, Rita criou uma página no Facebook com o nome The world of bijoux, onde mostrava as peças de bijuteria que fazia. Vendia-as no café dos pais, às funcionárias na escola, às vizinhas, a quem mostrasse interesse.
“Com o tempo cheguei à costura. Uma paixão já de família. A minha avó paterna era costureira e aprendi a coser com ela. Ela bem se esforçou por me ensinar, mas facilmente percebemos que eu sou melhor a coser à mão do que à máquina. A minha avó diz que eu sou uma desgraça a coser à máquina, porque lhe parto sempre as agulhas todas”, diz, com uma gargalhada.
Aos brigadeiros e às pulseiras de missangas começou a juntar peças de artesanato: bolsas, pequenas carteiras, objetos decorativos em feltro, “que é uma matéria bastante fácil de coser à mão”. Em 2016, já com mais produto decidiu transformar a sua página de Facebook, na marca Mimos Criativos, com que assina agora as suas criações.
É com ela que, a partir desta quinta-feira estará na feira da Brandoa. “Também faço almofadas, personalizo tecidos e bonecos com os nomes das crianças e aproveito as datas especiais, como o Natal, a Páscoa, o Dia dos Namorados, ou o Dia da Mãe, que está para breve, para produzir peças únicas”, explica à NiA.
Por enquanto, o artesanato é ainda um hobby. “Quem me dera poder fazer disto a minha vida profissional, mas em Portugal tratam-se muito mal os artesãos. Os portugueses não ligam nada ao seu artesanato. Chegam cá os estrangeiros, adoram tudo o que fazemos. Como é que se explica?”
A acabar a faculdade
Rita Rego apostou noutra paixão. Ou será a mesma? “Fiz um curso profissional de turismo, e em 2020/21 entrei na faculdade para fazer Gestão Turística. Falta-me só uma cadeira, que estou a acabar. Gosto muito da área do Turismo, até porque também tem muita ligação ao artesanato. Temos de saber valorizar o que é nosso”, sublinha.
A artesã, que continua a trabalhar numa loja no UBBO, vai aos mercadinhos de rua sempre que pode. E muitas vezes fica desolada com o que vê.
“Se lhe disser que, mesmo entre os meus amigos, há apenas um ou outro que me compra uma peça, acho que já estou a dizer tudo. Mais depressa vão a um hipermercado comprar uns chocolates ou às grandes lojas comprar uma coisa igual à que toda a gente dá, mesmo sabendo que têm uma amiga que faz coisas únicas”, diz à New In Amadora, confessando a sua “tristeza”.
Rita diz que não percebe como é que “malta que não tem muito dinheiro para gastar prefere dar uns brincos daquelas lojas dos centros comerciais que têm tudo igual, em vez de dar uma coisa personalizada, como um marcador de livro, um porta-canetas, um mealheiro, um babete para uma criança”.
A empreendedora faz isso tudo. Tem peças desde 1,5€ até um máximo de 30€. “Sou muito resiliente. Os meus pais ensinaram-me a nunca desistir. E, apesar disso, não estou sozinha nesta batalha. Tenho clientes fixos que são mães e avós e que me compram sempre coisas nas feirinhas”.
Carregue na galeria para ver alguns dos produtos feitos pela jovem amadorense.