Um dia depois de Portugal ter passado pelo maior detox digital de que há memória — fruto de um apagão generalizado de energia que deixou as famílias e as empresas sem luz durante várias horas —, a New in Amadora entrevistou o presidente da Câmara Municipal da Amadora, Vítor Ferreira, para perceber como a cidade reagiu a esta adversidade em tão pouco tempo. E, sobretudo, como nos podemos prevenir para episódios semelhantes.
Como é que a Amadora reagiu ao apagão registado esta segunda-feira, 28 de abril?
Com a normalidade possível, com grande serenidade e com uma grande interligação e comunicação entre todas as partes intervenientes no concelho: a Câmara Municipal, os serviços municipais de Proteção Civil, os Bombeiros Voluntários e as autoridades policiais. Quando o apagão se deu, eu estava de visita a uma escola e foi logo ali que se marcou uma reunião urgente com todas as entidades. Aliás, houve ontem, ao longo do dia, duas reuniões de crise: uma a seguir ao almoço e outra às 21h10, quando já tinha sido restabelecida energia em algumas partes do concelho.
Quais foram os principais problemas sentidos?
O modelo de sociedade que fomos construindo ao longo dos anos em todo o mundo está muito dependente da tecnologia e, portanto, da eletricidade — e acho que este apagão de ontem pode ser um bom pretexto para refletirmos até sobre as pequenas coisas do nosso dia-a-dia, enquanto cidadãos. Mas aqui na Amadora, os principais problemas creio que foram idênticos aos sentidos em todas as grandes cidades do país: problemas de comunicação telefónica e de Internet, problemas com os semáforos e organização do tráfego. Tenho indicação que houve alguns casos de pessoas que ficaram presas em elevadores e que os bombeiros tiveram de acorrer para resolver essas emergências.
Num primeiro momento, pensou-se que o apagão seria uma coisa aparentemente rápida. Depois, quando se percebeu que a resolução poderia demorar horas — e chegou a falar-se em dias —, ter-se-ão colocado outros problemas. De que forma é que a Amadora estaria preparada para um cenário desses?
Essa foi a preocupação numa segunda fase: acautelar a noite, caso a energia não viesse até ao final do dia. As questões da segurança e da ordem pública estavam e estão no topo das nossas prioridades, portanto essa questão começou a ser tratada internamente durante a tarde. Mas à medida que fomos percebendo que havia zonas do país, sobretudo a Norte, onde a energia já tinha começado a ser resposta, percebemos que seria uma questão de horas. E, de facto, até às 22, 23 horas, todo o abastecimento de energia ao concelho estava reposto.
Mas haveria meios, por exemplo, para acautelar as questões de segurança, se não tivesse sido reposta a energia?
Sim, até porque a PSP assegurou que havia um reforço de meios. Os agentes, aliás, começaram a vir para a rua ao início da tarde, uma vez que não conseguiam fazer trabalho administrativo. E estava previsto um reforço de meios, caso não houvesse energia na parte da noite e, portanto, não haveria iluminação pública, para assegurar a ordem pública. Tínhamos esse contingente preparado, tanto por parte da Polícia Municipal, como da PSP.
Esta manhã um dos guarda-noturnos da Amadora contava que muitas empresas ficaram com as luzes acesas durante a noite e com as grades de segurança abertas, porque quando saíram não havia energia e não se aperceberam das luzes acesas. Tem registo de casos destes?
Tenho, sim. Felizmente, não houve problemas. A PSP e a Polícia Municipal detetaram alguns casos de lojas no centro da Amadora com portas elétricas de vidro que, às 21h30, 22 horas, com o regresso da energia, as portas estavam abertas, apesar de as lojas estarem fechadas.

E as escolas?
Nas escolas não houve problemas, foi tudo normal, até porque à medida que se percebia que a eletricidade não vinha, muitas empresas dispensaram os seus trabalhadores e, portanto, muitos pais foram buscar os filhos mais cedo às escolas. Aliás, gostava de realçar aqui o civismo da população, que veio para a rua, aproveitou para conviver, mas sem exaltação e sem qualquer tumulto.
Há pouco dizia que este caso deve servir para todos repensarmos a nossa vida coletiva e até a construção das cidades. De que forma é que isso pode ser feito?
Sim, cada vez é mais importante pensar as cidades sem esquecer estes fenómenos. Temos de estar preparados para fenómenos extremos, coisas impensáveis como a que vivemos ontem. Aliás, por alguma razão, a Câmara Municipal da Amadora há muito que nas suas formações e ações de sensibilização junto das escolas e dos lares, em conjunto com a Proteção Civil, fala da importância de termos um kit de emergência. Desde 2010 que essa preocupação está presente nas nossas ações de sensibilização. Esse kit deve ter água suficiente para 72 horas, alimentos enlatados, estojo de primeiros socorros, medicamentos para as questões de saúde mais comuns, rádio a pilhas, lanterna, tesoura ou canivete, bússola, apito e mudas de roupa.
O facto de a Câmara ter gerador próprio também ajudou.
Seguramente que sim, sobretudo ao nível do carregamento elétrico. Aliás, auxiliámos a PSP nesse contexto. Mas não só. Há cerca de um ano, a Câmara deu aos Bombeiros da Amadora um gerador, que era há muito ambicionado. Como se calcula, o gerador foi muito útil no dia de ontem, quer na alimentação das comunicações, quer até em coisas que muitas vezes nós não pensamos. Posso dar um exemplo: houve uma família que toma uma medicação que tem de estar refrigerada e, portanto, sabendo que os Bombeiros têm um gerador, foi lá perguntar se podiam armazenar o medicamento para ele ficar refrigerado.
A cidade acordou esta terça-feira sem vestígios do apagão?
Sem qualquer vestígio. Escolas, creches, lares e IPSS estão a funcionar normalmente. A primeira linha do Metro a funcionar foi a Azul, que é precisamente a que serve o concelho da Amadora. Os serviços municipais estão todos a funcionar — aliás, ontem à tarde os informáticos da Câmara montaram a operação para garantir que tudo o que são as UPS e os servidores estivessem operacionais para hoje de manhã. Portanto, retoma total da normalidade.