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José Figueiras e Pedro Chagas Freitas na Amadora para dar voz ao Cuidador Informal

A Santa Casa da Misericórdia vai organizar o segundo seminário dedicado ao tema "Cuidar de quem cuida".

É uma das missões mais ingratas, difíceis, sofridas que só agora começa a merecer a dignidade e o reconhecimento devido por parte da comunidade. O papel do cuidador informal envolve garantir o bem-estar físico, mental e social de uma pessoa dependente, prestando cuidados diários, administrando medicação, promovendo a autonomia e mantendo um ambiente seguro. 

“Este papel implica também a colaboração com profissionais de saúde e a comunicação de alterações relevantes, bem como a promoção da socialização da pessoa cuidada. Além de apoiar as necessidades básicas, é fundamental respeitar a dignidade, a autonomia e a privacidade da pessoa”, explica a Santa Casa da Misericórdia da Amadora.

Ajudar na higiene, alimentação e administração de medicação, de acordo com as orientações médicas. Estimular a pessoa a fazer o máximo possível por si mesma, adaptando o ambiente para prevenir acidentes e facilitar a mobilidade. Incentivar a pessoa a manter-se socialmente ativa e a manter o contacto com familiares e amigos, sempre que possível. Comunicar quaisquer alterações no estado de saúde da pessoa aos serviços de saúde e de ação social e participar nas formações previstas. Adaptar a casa e o ambiente para garantir a segurança e o conforto da pessoa cuidada. São estas as principais atividades de um cuidador informal, num trabalho tão duro como desgastante, sobretudo se o cuidador for familiar da pessoa cuidada.

Durante anos, esta realidade passou ao lado da maior parte das pessoas, mas “felizmente, os tempos estão a mudar”, diz à New Amadora, o apresentador José Figueiras, um dos oradores do seminário Cuidar de Quem Cuida, organizado pela Santa Casa da Misericórdia da Amadora.

A mãe de José Figueiras tem 90 anos.

Natural de Queluz, no vizinho concelho de Sintra, o apresentador da SIC e a irmã dividem, entre as complicadas agendas laborais que têm, o papel de cuidadores da mãe, que tem 90 anos, “mas está com uma cabeça incrível”. “O problema dela é a mobilidade, já dava muitas quedas.”

Figueiras e a irmã decidiram ainda contratar uma profissional de saúde que passava o dia com a mãe. “Mas isso não nos resolvia o problema. Durante o dia, tudo bem, mas depois à noite e ao fim de semana eu e a minha irmã tínhamos de nos revezar”, conta à New in Amadora, acrescentando que nos casos deles, “mais do que doloroso, era desgastante.”

“Consciencializar as pessoas para a dureza da vida dos cuidadores”

A solução, revela à NiA, foi colocar a mãe no Lar da Misericórdia, em Alfragide, no Bairro do Zambujal, onde “ela é tratada muito bem”. Aliás, o lar tem ao lado uma creche e os miúdos vão brincar com os mais velhos à tarde. “A minha mãe adora porque tem montes de netos”, brinca.

O apresentador diz que este tipo de seminários é fundamental para “consciencializar as pessoas para este problema doloroso”.

José Figueiras não estará sozinho no evento. Ao seu lado terá um outro cuidador, de natureza diferente, o escritor Pedro Chagas Freitas, que em 2024 viu o filho Benjamim sofrer de uma doença rara no fígado.

A doença exigiu que o miúdo fosse submetido a um transplante de fígado, tendo estado internado em cuidados intensivos. O escritor partilhou nas redes sociais o sofrimento da família, como o período que passaram no hospital e a angústia constante de ver o filho lutar pela vida. 

“O Benjamim está bem, esse é o milagre maior: estar bem. É o milagre pequeno de continuar a existir. É espantoso, não é?”, começa por perguntar à New in Amadora, acrescentando que quem cuidou de si, enquanto o escritor cuidava de Benjamim, “foi o amor”.

“Fui, sou, muito amado pela minha mulher, pelo meu filho, por quem me ama. De resto, ninguém cuida realmente de quem cuida. Quem cuida aprende a desaparecer por dentro, enquanto sorri por fora. Aprende a ser espinha dorsal quando está tudo a desabar. É assim que tem de ser: quando estás a cuidar de alguém que amas, deixas de ser o protagonista da tua própria vida. Cuidar de alguém é aprender a ser invisível. A mim não me custou nada, não foi um acto de sacrifício; foi um acto de amor.“

Pedro Chagas Freitas partilhou a sua dor com os seus seguidores.

“Nada muda em nós, quando não dói”

Para o escritor, “a importância destas reflexões está no desconforto e no amor. Nada muda realmente enquanto não dói. Estes seminários são instrumentos para dar forma concreta àquilo que geralmente se tenta varrer para baixo do tapete da sociedade: o facto de milhares de pessoas estarem a desmoronar-se silenciosamente enquanto cuidam de quem amam. Fala-se de cuidadores informais como se fosse uma categoria social bonita, quase romântica. Na verdade, é um exército de gente exausta, esquecida. Estes espaços servem para lembrar que cuidar não é uma vocação; é uma ferida aberta à vista de todos, que quase ninguém quer ver. Temos de olhar para ela, cobri-la com amor, com ternura”.

Chagas Freitas, que se ‘despiu’ em frente a 10 milhões de portugueses, não se deixa, porém, iludir. “Gostaria de acreditar que estes encontros servissem para aumentar a empatia e o reconhecimento pelos cuidados, mas não acredito muito. As pessoas comovem-se depressa e esquecem-se depressa. A empatia dura o tempo de uma partilha no telemóvel. O sofrimento alheio é um produto de consumo rápido: emociona durante três minutos e depois desaparece, substituído pelo próximo drama.”

O seminário Cuidar de Quem Cuida decorre quarta-feira, 5 de novembro, Dia Mundial do Cuidador Informal, no auditório da Santa Casa da Misericórdia da Amadora. Além de José Figueiras e Pedro Chagas Freitas, serão oradoras também a assistente social Sandra Elvas, a professora universitária Carla Pinto e Paula Paixão Senra, presidente da Associação de Psicologia Positiva, Florescimento Humana e Societal.

As inscrições podem ser feitas através do preenchimento do formulário online.

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